A constatação prévia, prevista no artigo 51-A da Lei nº 11.101/2005, introduzido pela Lei nº 14.112/2020, é uma etapa preliminar em alguns processos de Recuperação Judicial que visa verificar a viabilidade e a situação da empresa que está solicitando a recuperação.
Embora não seja obrigatória em todos os casos, ela pode ser determinada pelo juiz se houver dúvidas sobre a viabilidade da empresa ou a veracidade das informações fornecidas, para melhor conduzir o processo de recuperação judicial, e para evitar demora injustificada deve ter o prazo de 5 (cinco) dias para que o profissional nomeado apresente o laudo, de forma a acelerar o procedimento.
Os principais aspectos que a constatação prévia procura verificar incluem:
- Reais Condições de Funcionamento da Empresa: visa verificar se a empresa está de fato em funcionamento, avaliando aspectos como a continuidade das operações, a existência de empregados e atividades comerciais regulares.
- Regularidade e Completude da Documentação Apresentada na Inicial: A verificação se a documentação apresentada pela empresa no pedido de recuperação judicial está completa e em conformidade com os requisitos legais. Isso inclui checar se todas as demonstrações financeiras, relação de credores e demais documentos exigidos foram apresentados de forma correta e completa.
Se durante análise pelo perito forem encontrados indícios claros de fraude, o juiz pode comunicar o Ministério Público para que sejam tomadas as medidas criminais necessárias. Isso garante que tentativas de abuso do processo de recuperação judicial sejam investigadas e punidas.
Esses requisitos garantem que a constatação prévia não apenas avalie a viabilidade da empresa para a recuperação judicial, mas também assegure a transparência e a honestidade no uso desse mecanismo legal. Garante que o pedido de recuperação judicial não seja utilizado de forma inadequada e que a empresa requerente realmente tenha chances de superar suas dificuldades financeiras e continuar suas operações de forma sustentável.
No entanto, há correntes que acreditam que, mesmo que a norma tenha sido positivada, ela não possui funcionalidade e prejudica o objetivo do instituto da Recuperação Judicial, que é a negociação entre devedor e credor. Segundo essa visão, o indeferimento da petição inicial por apresentação de informações falsas permite que o empresário devedor continue a contratar e prejudicar terceiros no mercado.
Essas correntes defendem que a apuração da veracidade das informações, ou seja, a análise de mérito, deve ser realizada durante o desenvolvimento da recuperação judicial pelo administrador judicial nomeado. Isso permitiria que os credores analisassem a viabilidade econômica do Plano de Recuperação Judicial, possibilitando uma decisão informada sobre o futuro da empresa em recuperação.
Conforme preceitua Marcelo Sacramone em sua obra “Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência”, nas páginas 280:
“Ainda que célere e mesmo que eventualmente sem custo, ou com custo absolutamente diminuto, haja vista que cabe ao perito apenas a constatação da existência, a perícia prévia deve ser evitada ou, ao menos, ser considerada absolutamente excepcional, pois, além de absolutamente sem nenhuma funcionalidade, gerará efeitos contrários ao pretendido pela lei.”
Em conclusão, a constatação prévia, é uma ferramenta importante para garantir a viabilidade e a transparência nos processos de Recuperação Judicial. Ao verificar as reais condições de funcionamento da empresa e a regularidade da documentação apresentada, busca-se assegurar que o processo seja utilizado de maneira justa e eficaz, protegendo os interesses dos credores e prevenindo abusos.
No entanto, existe um debate significativo sobre a funcionalidade e a efetividade desta etapa preliminar. Algumas correntes argumentam que a constatação prévia pode ser contraproducente, gerando atrasos e custos adicionais que prejudicam a negociação entre devedor e credor. A sugestão é que a veracidade das informações seja apurada durante o desenvolvimento da recuperação judicial, permitindo uma análise mais aprofundada e informada por parte dos credores sobre a viabilidade econômica do plano de recuperação.
Portanto, enquanto a constatação prévia pode ser uma ferramenta útil em determinados casos, é essencial que sua aplicação seja criteriosa e equilibrada, de forma a não comprometer a eficácia e a agilidade do processo de Recuperação Judicial. A decisão sobre sua utilização deve sempre considerar o melhor interesse da empresa em recuperação e de seus credores, buscando a melhor solução possível para a continuidade das atividades econômicas e a preservação dos empregos e da produção.
Referência bibliográfica:
BRASIL. Lei nº 11.101/2005 – Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm
BRASIL. Lei nº 14.112/2020 – Altera as Leis n os 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, 10.522, de 19 de julho de 2002, e 8.929, de 22 de agosto de 1994, para atualizar a legislação referente à recuperação judicial, à recuperação extrajudicial e à falência do empresário e da sociedade empresária. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l14112.htm
Sacramone, Marcelo Barbosa. Comentários à lei de recuperação de empresas e falência – 4ª Edição – São Paulo: SaraivaJur,2023.